Por Daniel Felipe
“A cabeça — pois era realmente uma cabeça, uma cabeça de gente, uma cabeça de mulher — estava ali, no chão, em plena rua, sob o sol, naquela radiosa manhã de domingo. De quem era? Quem a pusera ali? Por quê? Ninguém sabia…”
Assim começa o conto que fecha e dá nome ao livro publicado por Luiz Vilela (1942) em 2002. Com um tom coloquial e diálogos tão afiados quanto aparentemente triviais, o autor mineiro de Ituiutaba traça um panorama do comportamento humano quando em contato com um fato absurdo. Na trama, a cabeça encontrada na rua faz com que uma porção de transeuntes se junte ao seu redor.
O texto em momento algum pretende desvendar os mistérios que envolvem a descoberta do membro, elencados logo na abertura. Antes, interessa a Vilela observar a pequenez desses inúmeros curiosos que se agrupam e passam a jogar conversa fora no local. Uma mediocridade cristalizada na simplicidade e na potência dos parágrafos finais:
“A cabeça, os curiosos, o mistério; a rua, o bairro, o sol quente e a manhã de domingo passando.
‘É’, disse o homem de terno e gravata: ‘a prosa está boa, mas…’”.
A prosa está boa, mas para Luiz Vilela neste conto a mediocridade humana talvez seja um mal para o qual não exista salvação.
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Na seção “Conto brasileiro”, apresentamos pequenas obras-primas nacionais.
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Serviço
A Cabeça (contos), de Luiz Vilela
Editora: Cosac Naify (in memoriam), 2002

